Escrito e dirigido por Giuseppe Tornatore, Baarìa - A Porta do Vento é um filme autobiográfico,uma saga épica sobre a vida e a morte, amor e ódio, que acompanha 40 anos de história em uma vibrante cidade siciliana durante a primeira metade do século 20. O filme segue a vida de Peppino Torrenuova,
desde sua infância como um filho problemático na década de 30, passando pela Segunda Guerra Mundial e o autoritário regime fascista, até seu romance proibido e casamento com a bela Mannina, que culmina em uma tumultuada vida política ao ingressar no Partido Comunista Italiano. Uma jornada cheia de emoção, nostalgia, alegrias e tragédias em um mundo tão distante do nosso, porém tão próximo.
Giuseppe Tornatore é definitivamente um grande cineasta. Talvez por isso, os produtores não questionaram muito uma das maiores produções já realizadas na Itália, Baarìa – As Portas do Vento. A trama abrange
praticamente toda a vida de Peppino (Francesco Scianna), ou seja, uma boa parte do século XX, incluindo todas as mudanças políticas e sociais ao passo que o garoto se transforma em um rapaz e constitui família.
Apesar de muito pretensioso, esse escopo narrativo já foi empregado maravilhosamente bem ao longo da história do cinema. Baarìa, entretanto, é uma exceção. O resultado não é negativo, mas Tornatore cai diversas vezes em lugares comuns e não consegue evitar maneirismos, tornando sua história superficial.
O roteiro não vai além e tudo o que se vê é uma série de anedotas conectadas pelo protagonista e pelo lugar que retrata. Ao filme, é imposto um frívolo comprometimento com o humor (por vezes grosseiro e caricato) que impede o espectador de enxegar os personagens densamente.
Tornatore se encontra utilizando cenários épicos, participações especiais de astros e estrelas italianos,artifícios da fotografia e a maravilhosa trilha do igualmente maravilhoso Enio Morricone, para criar a ressonância que não há na história. Ainda assim, não obtém sucesso.
Lá pelo finalzinho do filme, o roteiro mostra-se engenhoso e eleva os simbolismos da trama. Até funciona, mas assim como o garotinho que protagoniza a cena, o recurso está muito atrasado. O deslumbre de Tornatore é tanto que ao invés de reverenciar o passado, torna-se refém de umcinema superlativo que não dialoga com o restante de sua obra.
A Porta do Vento poderia bem ser A Corrida do Tempo, pois nesse maravilhoso filme de Giuseppe Tornatore a corrida em busca do destino é essencial. O mesmo diretor de Cinema Paradiso volta em um quase documentário autobiográfico, passado na Itália durante cinco décadas, focado no relacionamento humano, na índole italiana, tendo como forte pano de fundo a política. Ela que, lá, é visceral e conturbada desde sempre. Começamos em uma cidadezinha da Sicília, Barrìa, nome fenício, onde as ruas são medievais e estreitas, e o povo muito empobrecido por guerras e contendas políticas. O deboche de si mesmos é o tom em muitas situações, como no início do filme, quando o pequeno Pepino sai correndo para comprar cigarro e ganhar vinte libras, mas se perde em devaneios quando chega ao topo de um morro e vislumbra a cidade abaixo. Ao chegar havia demorado
muito e não quer as moedas nem de graça. Esse garoto é o símbolo do determinismo às coisas que acredita e que lhes são passadas por seus pais. O país está arrasado pelo fascismo e o Partido Comunista Italiano tenta se
firmar como outra opção. Pepino na escola, talvez com 10 anos, é colocado de castigo pela professora por se recusar a cantar o hino fascista. Deixado em um canto, acaba adormecendo.
O filme avança e esse garotinho passa a trabalhar duramente como ajudante de um pastor de ovelhas. Na adolescência, ordenhava vacas, em plena rua, para vender o leite e ajudar no orçamento familiar. O irmão mais velho era seu guardião, mas fora convocado para a Segunda Guerra Mundial contra sua vontade. Pepino, apaixonado por uma garota, a belíssima Mannina, sonha em casar-se com ela. Seus pais, católicos e democráticos, não querem nem pensar nessa união sem futuro. Pepino mostra sua ousadia tirando-a para dançar. Dada em noivado a um homem rico, que seria a salvação da casa, desespera-se e lhe pede ajuda. Pepino e Mannina são belos e apaixonados. Com a proibição exasperada do pai, resolvem o problema do noivado indesejado, refugiando-se na própria casa da noiva,trancando as portas e janelas. Cinéfilo inveterado tivera essa ideia ao assistir um filme com Fred Astaire.
A mãe da jovem aquiesce, o pai de Pepino os leva para casa e eles se casam. O primeiro filho morre e o jovem é obrigado a fazer, ele mesmo, o caixão da criança, abrir a cova no cemitério e enterrá-la.
É uma cena forte e emocionante. O romantismo socialista da época é o que o conduz. A Máfia e seus crimes são duramente apresentados, mas com humor, o que torna o filme mais dinâmico. A mudança de artistas nas etapas das vidas dos protagonistas é muito bem feita, sendo os traços característicos de beleza sempre preservados. Passamos a vê-los mais velhos, com três filhos e ela esperando o quarto. O tempo linear não é observado, mas fragmentado para que possamos entender melhor a proposta de Tornatore, que é fazer um trabalho denso, cheio de humor, dinâmico, pleno de sons e vida. Trechos como do Cinema Paradiso se repetem, como quando um de seus filhos passa colecionar fotogramas como se fossem figurinhas. A essa altura, Pepino já estava com um lugar assegurado no partido. Começam as viagens para sustentar a família e conhecer Moscou e seu regime, à custa do Partido. Para que possa ter um casaco grosso de inverno tem que ludibriar um dos companheiros e ocorrem momentos engraçadíssimos. Muitos homens e crianças encontravam-se mutilados pela guerra e pelas granadas perdidas espalhadas pelo campo. A história prossegue e seu pai, agora
envelhecido e doente, em seu leito de morte, ainda murmura: a política é bela. Os anos correm e chega o momento em que ele consegue eleger-se para um cargo político na Câmara e realizar-se. O filho caçula é sua imagem, tanto em convicções políticas como fisicamente. Ambos são considerados pessoas de difícil convívio.
Esse jovem deseja um futuro melhor e parte para completar sua educação em uma universidade. O terço final desse longo filme é bastante comovente, contando com cenas preciosas e conclusivas para o entendimento da obra.
Um longa-metragem emocionante e hilário, que deve ser um dos melhores de 2010. A crítica italiana caiu em cima desse trabalho, por ter sido produzido pela Meduza, do grupo Mediaset de Berlusconi, mas mesmo assim foi o filme de maior bilheteria de Guiseppe Tornatore, segundo entrevista dada ao Estado de São Paulo.
Baarìa que significa a porta do vento em árabe, e é como os moradores chamam a cidade de Bagheria, é cinema na sua essência mais profunda, numa cena um garoto troca figurinhas por pedaços de película, coloca-as contra
o sol e vai adivinhando o filme pela cena impressa ali. É incrível a capacidade do diretor italiano em construir poesia com imagens. Eu que já achei que ele tinha feito de tudo com Cinema Paradiso (1988), voltei-me a surpreender e emocionar-me. Giuseppe Tornatore fez um filme maravilhoso, belo e simples, e quando achamos que acabou, as lágrimas escorrem do rosto feito cachoeira
Elenco: Monica Bellucci, Raoul Bova, Michele Placido, Ángela Molina, Laura Chiatti,
Enrico Lo Verso, Luigi Lo Cascio, Gisella Marengo.
Direção: Giuseppe Tornatore
Gênero: Drama
Duração: 150 min.
Distribuidora: Paris Filmes
Curiosidades:
Do mesmo diretor do clássico 'Cinema Paradiso'.
Filme de abertura do Festival de Veneza de 2009.
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