“Um grande garoto” é uma adaptação do livro homônimo, escrito por Nick hornby, considerado um dos maiores da literatura pop contemporânea. Seus livros já originaram filmes como “Alta fidelidade” e “Amor em Jogo”. Além desses, outros dois livros do autor já têm seus direitos comprados (“A long way down” e “How to be good”). Passado para as telas do cinema, os méritos ficam para o roteiro, redigido por Peter Hedges e Chris Weitz, que recebeu muitas nomeações a prêmios importantes, como o Oscar, Globo de Ouro, BAFTA e o prêmio do sindicato dos escritores.
Utilizando de maneira apropriada a narração em off,o filme nos apresenta dois personagens completamente distintos e interessantes. Will (Hugh Grant, sempre eficiente) é um solteiro convicto e vagabundo assumido. Nunca trabalhou, nunca teve um relacionamento sério, e orgulha-se disso. Seu grande objetivo no momento é ocupar as horas de seus dias e conseguir o máximo de mulheres que puder, com o mínimo compromisso possível. Do outro lado temos Marcus, um garoto estranho e completamente inadaptado a sua escola. Talvez o ponto mais falho do filme seja forçar por demais o lado excêntrico de Marcus no ínício da trama, tornando sua evolução pouco verossímil. Através de circunstâncias inusitadas, o garoto encontra Will e, de forma gradativa e bem desenvolvida na narrativa, vão se entendendo e complementando.
Durante todo o filme, o tom criado pela direção alterna entre uma comédia leve, drama e comédia romântica, de maneira perspicaz. Os personagens principais têm conteúdo, que é devidamente explorado. É muito fácil se deixar levar pelo ritmo leve e divertido do longa, e passar a simpatizar cada vez mais com aqueles excêntricos personagens. E, mais uma vez, palmas para Hugh Grant; no papel de canastrão, ele esbanja simpatia e ganha nossas risadas da mesma forma que sempre fez nas comédias românticas que marcaram sua carreira.
Como em todas obras de Nick Hornby, temos a quantidade certa de humor, romance, drama e o grau necessário de complexidade para os personagens. Nada em excesso, mas também nenhum ingrediente em falta. A homogeneidade da mistura garante um bom filme, daqueles que caberiam com perfeição nos bons tempos da Sessão da Tarde.
Há duas maneiras de se ver Um Grande Garoto (About a Boy – 2002), filme dos irmãos Chris e Paul Weitz, adaptação do livro homônino do escritor britânico Nick Hornby. A primeira delas eu já destaco no parágrafo acima: é tratar Nick Hornby como um mero escritor e o filme como uma mera adaptação. Olhando por esse foco que, convenhamos, será o enfoque que a maioria do público terá, enxergamos um drama exemplar de como os adultos não estão ou simplesmente não querem envelhecer (tema básico da literatura de Hornby).
Hugh Grant é Will Freeman, um trintão metido a galã que é viciado em cultura pop, tem alergia à palavra "relacionamentos" e repete a palavra "cool" como uma criança pequena diz "mamãe". Will tem a vida que todos nós pedimos a Deus: o cara não trabalha, ou melhor, nunca trabalhou, já que sua renda mensal é engordada pelos direitos autorais de uma canção natalina que seu falecido pai compôs e se transformou em um símbolo do natal (mais ou menos como "Feliz Aniversário" é para os aniversariantes).
Will passa seu dia preenchendo intervalos de meia hora com jogos de bilhar, massagens faciais, compras de cds e namorando e dispensando mulheres. Tudo muito... "cool" até que um moleque de 13 anos invade sua vida. Nicholas Hoult é Marcus, tem 13 anos e é totalmente o oposto de Will. Vive uma vida de hippie educado por uma mãe que tenta fazer do garoto um exemplo de atitude, mas não sabe que, na escola, uma pessoa de atitude (ainda mais um moleque de 13 anos) é muitas vezes confundida com um ser de outro planeta. Will e Marcus acabam se conhecendo, se envolvendo e descobrindo coisas em comum que, claro, irão mudar o jeito de cada um deles olhar o mundo.
Como literatura, Um Grande Garoto é exemplar. A maneira como Hornby vasculha os sentimentos alheios é sublime, retratando de forma genial esse tipo todo estranho que é o homem de trinta e poucos anos da virada de século. Como cinema, complica um pouco. Parte da complicação vem da produção que optou por não detalhar a obra pegando o supra sumo do livro. A opção pelo não detalhismo acaba transformando Um Grande Garoto em um filme comum, sem muitos atrativos. Se por um lado o transforma em um filme comum, também facilita seu entendimento ao público médio. Uma faca de dois gumes, sempre, mas em se tratando de um mero escritor e de uma mera adaptação, o resultado é até ok. É ok porque Hornby é cool até não poder mais e nem mesmo uma adaptação morna apaga isso.
Outro ponto a favor é a escolha de Grant para o papel principal. Hugh encara a perfeição o papel de canalha assumido (depois de dois papeis de canalha assumido no currículo - Trapaceiros, de Woody Allen, e o Alta Fidelidade para mulheres, Diário de Bridget Jones) e é responsável por várias passagens excelentes.
Mas, todos esses pontos a favor caem por água abaixo em uma visão mais cuidada do filme. Para todos aqueles que conhecem bem Nick Hornby, Um Grande Garoto é uma adaptaçãozinha. Ao limar os detalhes, a direção do filme limou também as excentricidades de Hornby (música, cinema, literatura, isso que chamam cultura pop). Mais. Ao deixar de fora o episódio Nirvana (talvez, a grande sacada do livro já que o prórpio livro remete a uma canção de Kurt Cobain), a versão cinemão de Um Grande Garoto perde um dos ganchos principais que talvez fisgassem jovens nas filas em frente à tela: a relação do mito com seu mistificador.
O grande sinal dessa falta de cuidado (apesar que flâmulas do Arsenal pousam aqui e ali) fica evidente quando na primeira e última frase do filme surgem uma citação de Jon Bon Jovi. Quem usa camisetas do Teenage Fanclub em entrevistas, escreve resenhas sensacionais sobre discos diversos (de Steve Earle a Aimee Man, passando por Nick Cave) e é fã confesso de Elvis Costelo, não faria uma citação que Rob Fleming desaprovaria.
Assim, trafegando entre o pop e o popularesco, Um Grande Garoto surge poético em algumas partes e patético em outras. Deve agradar ao público médio tanto quanto deve decepcionar fãs de Hornby já que as principais partes patéticas são exatamente no começo e no final do filme, como se fossemos comer um doce que na primeira mordida é ruim, melhora no meio, mas é detestável no final. Qual gosto fica na boca, caro leitor? Para mim, o de que Nick Hornby merecia mais. E nós também, e nós também.
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